As trilhas que percorremos no Web Summit Rio

19 de maio de 2023 9 minutos
RPMA

E como elas podem impactar no futuro da sua empresa

Mais de 21 mil participantes, de 91 países, se reuniram no Web Summit Rio, para três dias de eventos, com mais de 170 sessões diárias, dispostas em formatos diversos como palestras, mesas-redondas, master classes, apresentações de startups, sessões de Q&A e rodadas de investimentos, entre outros.

A exemplo do SXSW, o Web Summit manteve na sua primeira edição em solo brasileiro o formato dinâmico que impossibilita uma experiência concisa e abrangente; acompanhar oito horas diárias de discussões requer planejamento e, ainda assim, a aceitação de que teremos acesso a apenas uma ínfima parte de todas as sessões.

Para facilitar a programação de agendas individuais, os conteúdos do Web Summit foram divididos em trilhas. O que trazemos neste hack são as trilhas percorridas pela equipe da RPMA, que se aprofundou em temas que vão impactar a forma como as empresas se comunicam.

Preparado para a jornada?

IA: o elefante na sala

A inteligência artificial (IA) foi o principal assunto do evento, e não tinha como ser diferente: os avanços na área já começaram a impactar inúmeros setores da economia, e os participantes, de áreas diversas, como marketing, tecnologia, saúde, educação e finanças para citar algumas –, estavam ávidos por novidades. A previsão de Daniela Braga (Defined.ai), uma das 12 conselheiras da força-tarefa National Artificial Intelligence Initiative, destinada a aconselhar Joe Biden, presidente dos EUA, deu o tom do evento: “A IA é a próxima revolução industrial.”

A popularização instantânea do ChatGPT, principal nome associado à IA generativa, expandiu a discussão do tema para além dos tecnólogos e gerou um alvoroço em torno das potenciais ameaças associadas à ferramenta. Nesse sentido, a regulamentação surge como medida urgente para pavimentar um caminho ainda em vias de construção. 

Para Chelsea Manning, consultora de segurança da Nym, hoje a IA é o elefante na sala e, por esse motivo, chama a atenção para a necessidade de regulamentação ética, enquanto convida os especialistas no assunto a se responsabilizarem pela ética de mercado: “Diferentemente de médicos e advogados, que têm séculos de profissão e um código ético sólido, os tecnólogos têm um papel muito importante, para regulamentar a profissão e também apontar os potenciais danos que as novas tecnologias possam trazer.”

Sarah Al-Hussaini, COO da Ultimate, entende que a identificação dos conteúdos gerados por IA deve ser compulsória: “A pessoa precisa saber que não há intimidade em uma conversa, mas, sim, uma relação transacional com uma máquina, senão teremos uma distorção na relação com as marcas.”

“Sempre haverá bons e maus atores usando a tecnologia, cada qual a seu modo. A solução é abraçar a inovação e garantir que haja uma regulamentação rápida e eficaz”, enfatiza Don Muir, CEO da ARC.

Empresas “powered by AI”

Quais as vantagens da adoção da IA nas empresas? Um ponto pacífico entre os especialistas é que os altos investimentos apenas fazem sentido, se houver um plano de ação ou um problema específico a ser resolvido nas empresas.

Embarcar na hype do momento pode ser infrutífero, caso não exista uma sólida estratégia atrelada à adoção de novas tecnologias.  

Segundo Ana Buchaim, CMO da B3. “Nós investimos cinco vezes mais em IA que a média das empresas, porque precisamos estar preparados para o próximo nível, mas a análise feita por pessoas é o impacto mais importante.”

Luiz Grecco, VP de Digital Solutions da CI&T, apresenta um futuro de possibilidades potencializadas pela IA: “Não há nada a temer, pelo contrário: há muitos novos campos a ser explorados. Utilizar a inteligência artificial para gerar códigos significa uma quantidade infinita de tentativas de criar novas coisas. Em vez de testes AB, poderemos fazer testes de A a Z.”

De acordo com um estudo feito pela CI&T, 50% das empresas já investem em inteligência artificial; num futuro próximo, serão 90%. “Cerca de 75% dos desenvolvedores já usam inteligência artificial para acelerar o aprendizado e ajudar em tarefas recorrentes. Isso mostra que a curiosidade é muito maior do que o medo.”

A empresa tem um hub de inovação com mais de mil pessoas conectadas, trocando informações e cocriando com inteligência artificial, além de 150 clientes que investem e já se beneficiam com essas inovações.

Sarah Al-Hussaini não esconde sua empolgação: “A IA vai mudar a forma como lidamos com a tecnologia, deixando-a mais amigável para pessoas pouco familiarizadas. É importante não temer a evolução e não atrasar sua adoção.”

A velocidade da inovação faz aumentar a velocidade da adoção de novas tecnologias pelos consumidores, deixando-os mais propensos a mudanças, até mesmo de marcas. Esse é um alerta feito por Nancy Villanueva, CEO da Interbrand, para as empresas que ainda hesitam em acompanhar essa recente evolução encabeçada pela inteligência artificial: “A experiência do consumidor está evoluindo muito mais rápido do que as empresas podem acompanhar. Eles estão dispostos a mudar, e as marcas precisam entender isso para se manterem competitivas.”

Futuro do trabalho

“O ChatGPT vai roubar meu emprego?”. Você já pensou nisso, e muitos ao seu redor também. Essa é uma preocupação tão comum, que o tema foi abordado em inúmeras conversas. As previsões são em grande parte positivas, mas ainda há, entre os especialistas, os que tendem para uma visão mais apocalíptica. 

Um deles é Igor Marinelli, CEO da Tractian. Ele acredita que a IA vai substituir trabalhos repetitivos e ineficientes e, por causa disso, muitas pessoas serão substituídas. “Sabemos que a substituição vai acontecer, não temos como dourar a pílula, mas é preciso garantir que, ao menos, a qualidade dos trabalhos melhore”, provoca.

Daniela Braga (Defined.Ai) concorda com Marinelli em parte: em curto prazo, cargos que exigem pouca qualificação serão, sim, substituídos, porém, em longo prazo, a história muda. “Enquanto muitas vagas vão desaparecer, muitos trabalhos temporários surgirão para atender a demandas muito específicas. É uma ideia equivocada que a IA vai roubar os postos de trabalho.” 

Demandas muito específicas exigem pessoas mais qualificadas. Nesse sentido, Daniel Knopfholz, CTO de O Boticário, convida empresas privadas a abraçar a oportunidade: “Elas têm a responsabilidade de ensinar os colaboradores a repensar suas carreiras, preparando-os para o futuro em uma situação benéfica para ambos os lados. Haverá um gap, e cabe às empresas superá-lo.”

Paula Mageste (Edições Globo Condé Nast), no painel “Will ChatGPTkill journalism?”, toca num ponto muito sensível, ao falar em nome dos jornalistas e produtores de conteúdos, provavelmente os que mais se sentem ameaçados pela IA: “Existe uma crise geral de confiança na mídia; o jornalismo ainda precisa do fator humano, nós vamos a campo, nutrimos relacionamentos com fontes, temos nosso ponto de vista, possibilitamos a subjetividade. Somos importantes para restaurar a confiança perdida.”

Alex Collmer, CEO da VidMob, também acredita que muitos novos empregos podem ser criados para desempenhar funções ainda não imaginadas. E, para isso, todos precisaremos entender como utilizar a IA a nosso favor.

ESG: o fator humano da inovação

A maioria das discussões do Web Summit Rio 2023 apontou para um futuro de tecnologia, dados, inteligência artificial e códigos. Um futuro pouco humano. Mas não todas. O tema “ESG” esteve presente, como seria esperado em qualquer evento dessa magnitude, que reuniu agentes de diversos setores da economia. Para César Sanches, da B3, o assunto evoluiu de tal forma, que deixou de ser um custo associado à filantropia para se tornar um investimento e um diferencial competitivo.

Sergio Cisneros, consultor do LinkedIn para a Latam, abordou um tema que vem ganhando destaque ano a ano: as green skills (ou “habilidades verdes”, em tradução livre). “Hoje ainda temos uma oferta de profissionais com green skills alinhada com a demanda, mas a demanda vai ultrapassar a oferta a partir de 2024.” A América do Sul é uma das regiões que mais avançam no tema, atrás apenas dos EUA. E o Brasil é o grande motor da região: é o sexto mercado entre as top 25.  

As mulheres tiveram destaque no evento, responderam por 40% da audiência e 37% dos palestrantes. Das startups presentes, 22% foram fundadas por mulheres. Pode parecer pouco, mas em um cenário dominado por homens cis (que de identificam com o seu gênero de nascimento) e brancos, esses números trazem um alento.

Já o tema “diversidade” teve pouco destaque, mas aqueles que ousaram abordá-lo foram incisivos. Daniela Braga (Defined.ai) chamou a atenção justamente para a dificuldade que mulheres empreendedoras enfrentam na disputa por investimentos, objetivo de grande parte dos presentes no megaevento.

Monique Eville, investidora-anjo da Investivos, defendeu uma diversidade maior no cenário de influenciadores/criadores de conteúdo e encorajou as empresas a se responsabilizar por esse avanço: “As marcas fazem compromissos públicos, mas investem milhões em agências que contratam apenas influenciadores brancos. É preciso questionar os intermediários e garantir maior representatividade.”

Enquanto Monique aponta o efeito devastador que o discurso de ódio proferido em redes sociais tem sobre jovens negros periféricos, Thais Fabris, fundadora da 65/10, e Carol Delgado, da Puxadinho, apresentaram dados sobre pesquisa feita com meninas das periferias. “A maioria do mundo está à parte do que estamos discutindo aqui neste evento. E as meninas periféricas são as mais prejudicadas. Elas não almejam vagas de tecnologia, pois não acreditam que sejam para elas. Elas estão perto demais dos problemas, e são parte da solução”, conta Thais. Carol complementa: “Não dá para pensar em construir o futuro, quando há tanta gente passando fome.”

Para esses, o futuro não está nos dados.

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